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Ouça Esse CD: A Strange Arrangement (por Kildery Rafael)

  • Kildery Rafael
  • Dec 18, 2014
  • 4 min read

Uma pausa. Há dias em que pedimos por isso, em que evitamos os excessos, procuramos aguas cuja calmaria seja perene e que sejam isoladas desse turbilhão chamado rotina. Como não podia deixar de ser, há músicas até para esses momentos.


Não por rechaço aos bons pedais duplos do heavy metal, às batidas frenéticas da música eletrônica, à completude das composições do que se convencionou chamar de MPB ou ainda pelas veneráveis distorções das guitarras elétricas que se fazem presentes em tudo o que foi citado e muito mais, e sim por reconhecer que há uma música para cada momento, ou um álbum. E é aí que entra “A Strange Arrangement” de Mayer Hawthorne, CD sem muito reconhecimento da mídia especializada, de um cantor e compositor que ainda não solidificou sua carreira apesar de ter mais de um trabalho no mercado, mas que é composto por todos os elementos de aguas calmas, tão procuradas às vezes, que só o clássico Soul de raiz pode conferir às composições.


A Strange Arrangement - Mayer Hawthorne - Aeroplane

Mas, calma aí! Esforcemo-nos por mantermos os pés no chão. Deixe-me calibrar as expectativas que porventura posso ter suscitado. Não se trata de um trabalho digno de louros, em primeiro lugar por não ser inteiramente original. Segundo, não é o tipo de música que agrada todo mundo e a probabilidade de alguém que leia isso aqui, escute o CD e goste é bem pequena. Não impossível, diria improvável. E isso se dá, entre inúmeros fatores, excluindo-se o genérico termo tão usual “gosto”, pelo momento em que se escuta. Ora, como bem sabem os mais achegados, sou um entusiasta dos rituais. O prazer está nos detalhes, no momento destinado para uma atividade específica, num canto confortável, com um fone de ouvido que conceda a possibilidade de apreciar uma obra minimamente bem, com graves e agudos equilibrados. Essa história de se desdobrar em vários para executar várias tarefas ao mesmo tempo acaba por tornar o julgamento do que se aprecia injusto e por não querer cometer essa injustiça não me apresso a ouvir nada com ouvidos críticos, nem ler ou beber. Por isso posterguei tanto para escrever sobre esse álbum que, frise-se, seria o primeiro a ter um texto de minha autoria publicado no Aeroplane, contudo, por medo de faltar com a imparcialidade e justiça que o álbum merece, apesar das ressalvas acima citadas, não o fiz.


Conheci o trabalho de Mayer Hawthorne em 2011, quando esteve no Brasil para participar de um festival de Soul music e a opinião que tive sobre o mesmo permanece imutável até o presente: ele é, antes de qualquer intenção, um inovador. Digo isso sem claudicar por medo de cair no vício de passar uma informação errada ou incompleta. O camarada me traz o velho com cara de novo, mas sem cheiro de mofado das fitas, sem os arranhões dos discos e isso já vale muito num cenário musical tão conservador, restrito e não explorado pela juventude tupiniquim. Mais que isso, a inovação não se limita à inserção de novos instrumentos ou batidas eletrônicas resultando numa simples mistura de gêneros que, em muitos dos casos, não acaba logrando êxito no intento. Além disso, convenhamos, o simples fato de misturar dois gêneros deixou de ser inovação há muito tempo.


Sua voz carece de um vigor que não faz falta à música, sabe equalizar bem os elementos de destaque nas músicas com o tom de voz, afastando completamente a “deficiência” que de início se exibe, mas que, no fim das contas, percebe-se que é a característica maior do artista. O melhor de tudo é saber que o que se ouve gravado em estúdio muito se assemelha ao desempenho ao vivo, o que acaba por conferir mais pontos para o multi-instrumentista.


Ao executar o álbum tem-se um prelúdio de 27 segundos que se encadeia com a segunda faixa que, sem sombra de dúvidas, é uma das melhores do álbum. Junta com o a abertura do disco apresentam a leveza em tom de cinza que se faz presente por toda a obra, não deixando espaço para exageros ou grandes experimentos, o que torna a obra previsível, porém perfeitamente apreciável.


Maybe so, maybe no foi a faixa que me fez pesquisar sobre Mayer Hawthorne. Trata-se de uma regravação que muito se assemelha à do New Hollidays, banda da década de sessenta, mas que por estar mais nova e atual se sobressai.


Destaco ainda I wish it would rain, cuja introdução sugere uma música de tom mais obscuro e denso, mas que, no final, se mostra tão suave quanto às demais, inclusive em relação à letra que, apesar de ter uma temática de despedida, é executada de maneira que aventa um certo romantismo.


Outras faixas merecem destaque como Make her mine e Shine & New, músicas que dão para embalar um jantar com a pessoa que se gosta, mantendo o ambiente num clima acolhedor, romântico e divertido.


Todas as faixas são de duração média (em volta dos três minutos), o que não cansa nem te faz enjoar, mesmo se estiver ouvindo pela primeira vez. O conjunto da obra fala em favor do artista, entrega o que se propõe trazer desde o início e deixa no ar a certeza de que o artista ainda tem muita madeira para queimar. Não à toa que, apesar de sua pequenez naquele festival de Soul de 2011, ao se apresentar antes da estrela maior, a finada Amy Whinehouse, se sobressaiu. Sem dúvida é a calmaria que seus ouvidos precisam ouvir nesse momento.

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